A
PANTERA (1942)
Jacques
Tourneur conhecera VaI Lewton durante a rodagem de “A Tale of Two Citties”, em 1935, e entre ambos estabelecera-se
uma sólida amizade. Quando VaI Lewton foi convidado para ser produtor da RKO
não esqueceu Jacques Tourneur para o seu primeiro projecto, hoje em dia um
filme mítico, um “cult movie”, que quase todos consideram uma obra-prima do
cinema fantástico, e de que Paul Schrader retirou uma “remake” “actualizada”, e
bastante interessante, ainda que definitivamente “menor” em relação ao
original.
Falamos
de “Cat People”. Mas a génese
desta obra admirável tem uma história quase inacreditável, que Tourneur
explicou por diversas vezes, e que demonstra como certas obras-primas da arte e
da literatura mundiais têm o seu quê de ocasional, de fortuito, na conjugação
dos elementos que as tornam possíveis. Na verdade, à partida, ninguém diria que
“Cat People” se poderia tornar
num título referência da história do cinema:
“VaI Lewton telefonou-me: “Jacques, estou a pôr em
andamento um filme para a RKO, não sei muito bem o que virá a ser, mas queria
ter-te como realizador”. Fui a casa dele e aí explicou-me. “O patrão da RKO esteve aqui ontem e contou-me
que durante uma “party” alguém lhe disse: porque é que não faz um filme que se
chamasse “Cat People”? Durante toda a noite pensou nisso e achou que era um
excelente título. Por isso me disse: “Pois bem, boys, escrevam-me um argumento
que se possa chamar “Cat People”. Lewton contratou um amigo seu, o escritor De
With Bodeen, e nós os três fabricámos essa história. É uma história
verdadeiramente original, não a roubámos de nenhuma parte”.
E
numa outra entrevista, vai mais longe: “Inventámos
aquela lenda da Europa Central. Creio que foi uma ideia de Lewton. Ele adorava
aquele tipo de coisas. Penso que fui eu que sugeri que se devia adivinhar mais
a pantera do que vê-Ia. Eu tinha um tal medo que os tipos do estúdio juntassem
uma sobreimpressão que decidi, na cena da piscina, combinar uma panorâmica e um
longo “travelling” e criei eu próprio a sombra da pantera, durante o movimento
do aparelho, fazendo mexer o meu punho em frente da câmara. Acontecesse o que
acontecesse, não podiam dar cabo da cena em seguida. Quando Lewton mostrou o
filme aos dirigentes da RKO, estes ficaram furiosos e decidiram distribuí-lo a
baixo preço. O filme, para sua
grande surpresa, teve uma saída prodigiosa. Batemos mesmo o “record” de
exclusividade de “Citizen Kane” e “Cat People” salvou a RKO. Tive a surpresa de
descobrir um dia, na minha caixa de correio, um cheque com uma cifra
importante, assinado pelo patrão da companhia, agradecendo-me por ter dirigido
o filme. São coisas que já não acontecem nos nossos dias”.
Na
verdade, um tal filme deverá ter causado alguma estranheza aquando da sua
estreia. Os filmes fantásticos, sobretudo os de terror, viviam nessa época
essencialmente dos grandes monstros míticos, como Frankenstein, Drácula ou a
Múmia, quase todos eles produzidos pela Universal na década de 30, e esse
fantástico de sugestão, mais pressentido que visto, mais de clima e ambiente do
que de situação, terá provocado obviamente um certo retraimento inicial. Nenhum
cinema o quis estrear, até que o “Hawaii
Cinema”, uma sala recentemente inaugurada que havia estreado “Citizen Kane”, de Orson Welles,
produzido igualmente pela RKO, se arriscou, dado que não tinha nenhum outro
filme para ocupar a semana que se seguia. Mas, nessa semana de contrato, o
filme bateu todos os “records”, e na segunda semana o sucesso aumentou ainda.
Os exibi dores criaram então uma sessão extra, às 10 horas da manhã, para as
semanas seguintes. “Citizen Kane” fizera
doze semanas, “Cat People” atingiu
as treze e com este triunfo salvara a produtora de uma possível ruína, já que
esse ano de 1941 fora particularmente mau para a casa, um pouco por causa de “Citizen Kane” e dos problemas que a
obra de estreia de Orson Welles provocara.
“Cat People” é um filme exemplar das
características e dos métodos de Jacques Tourneur. Atentemos um pouco nele. A
obra abre com uma citação que introduz o tema: “Tal como a neblina paira sobre o vale, assim também o pecado ancestral adere às regiões mais
profundas da consciência” (Louis Judd, in “The Anatomy of Atavism”).
Junto
à jaula de uma pantera, num jardim zoológico, uma mulher desenha alguns esboços
que a não satisfazem, deitando as folhas fora. Uma delas é apanhada por Oliver
Reed, que se serve disso para meter conversa com a desenhadora. Quando deixam o
jardim, outra folha rasgada é levada pelo vento, e mostra uma pantera
atravessada por uma espada.
No
caminho para casa, Oliver Reed apresenta-se a Irene Dubrova, e procura um
processo para a convidar para um chá no dia seguinte. Ao chegar, porém, Irene
afasta os rodeios e convida-o directamente para esse chá em sua casa. Ao entrar
na porta da rua, Reed detém-se um instante olhando as escadas antigas e afirma
que “nunca o deixa de maravilhar o que
está por detrás de uma fachada”. O que estará por detrás do rosto de
Irene Dubrova e do seu mistério é a razão primordial do seu fascínio.
Ao
entrar na sala de Irene, um perfume “quente
e humano” surpreende-o. Uma elipse mostra-nos, momentos depois, com a
noite a cair sobre a cidade, Irene cantando junto à janela, após o que se
ouvem, como se de uma resposta se tratasse, os leões no zoo próximo. Ela
acha-os “naturais e repousantes”. Apenas
a pantera “a intimida, com o seu grito
de mulher”. Dá-se então conta da escuridão que envolve o quarto, mas
explica que a encontra “amigável”. Uma
estatueta equestre de um cavaleiro, com uma espada trespassando um felino,
intriga Oliver Reed. Irene explica-lhe que se trata da imagem de “D. João da Sérvia, um rei que expulsou os
mamelucos do seu país e libertou o povo de influências satânicas”. O
gato que a espada trespassa é “o símbolo
dos vícios”. Mas, alguns membros dessas seitas pecaminosas, seguidoras
de Satanás, refugiam-se na sua aldeia natal. Por isso ela se sente ameaçada.
No
dia seguinte, antes de se encontrarem para jantar, Reed compra um gatinho que
pretende oferecer a Irene, mas o bicho reage mal na presença da rapariga, e
esta confessa-lhe que “os gatos não
gostam dela”. Propõe trocar o animal por outro (para o que ambos se
dirigem à loja, onde a presença de Irene desperta um verdadeiro vendaval junto
dos animais enjaulados e assustados. A dona da loja afirma que “se pode enganar toda a gente, menos os
gatos. Eles têm reacções psíquicas que identificam o mal”).
Depois
de uma nova elipse, vamos encontrar Irene e Reed junto à lareira. Reed
adormecera, Irene vigia-lhe o sono. Confessam o seu amor, ele estranha que
ainda não se tenham beijado. Mas Irene teme esse momento.
Num
restaurante sérvio, onde o casal comemora o casamento na companhia de alguns
amigos, uma mulher fatal, que todos identificam com uma gata, dirige-se em
servo a Irene, e chama-lhe “irmã”, o
que visivelmente a transtorna.
Em
casa, junto do marido, recusa toda a intimidade e pede a Reed ternura e
compreensão. Ela teme o momento de ambos se tocarem. Voluntariamente enjaulada
no seu quarto, Irene esboça um gesto para abrir a porta que a separa do marido,
mas o grito longínquo da pantera afasta-a dos seus propósitos. Um mês depois,
de novo de visita ao zoo, encontra o empregado de limpeza, junto da jaula da
pantera. Ele não estranha que ela não tenha aparecido durante tanto tempo: “As pessoas felizes não vão visitar aquele
animal, que a Bíblia, nas “Revelações”, descreve como uma besta que se
assemelha ao leopardo, sem o ser”.
O
canário que tem em casa morre com o susto da proximidade de Irene e esta vai
levar o cadáver da ave à pantera do zoo, confessando depois a Reed que teve o
impulso de abrir a jaula e libertar a fera. O marido percebe então que algo de
grave se passa no seu espírito. Nada de errado há com ela, a não ser essa
crença que é necessário anular, para o que propõe uma consulta a um psiquiatra.
Num
consultório completamente na penumbra, apenas com parte do rosto de Irene
iluminado, esta, hipnotizada, vai revelando ao Dr. Judd os temores que a
perseguem e atormentam. Recapitulando o que de mais importante ouvira, o médico
refere-se a “essas mulheres sem controlo
nas paixões que matam o amante”. Irene julga-se filha de uma
mulher-gata, particularmente ciumenta, e grande parte dos seus presságios
confirmam-se quando encontra, em sua casa, junto do marido, Alice, a quem Reed
havia revelado as inquietações da mulher, o que esta não desculpa. É a
revelação da sua intimidade que a revolta, mas sobretudo os ciúmes que a
invadem.
Afasta-se
das consultas do Dr. Judd, que ela acha que não a podem ajudar, mas este vai
encontrá-la junto à jaula da pantera, onde resistiu a libertar a fera, e ambos
falam da “subtil distinção entre
espírito e alma. O seu espírito
nada tem, mas Irene acredita que a sua alma está contaminada”.
Num
dos dias seguintes, Oliver Reed tem de trabalhar à noite e sai de casa. Irene,
desconfiada, telefona para o escritório, onde Alice lhe responde, e vem
surpreender ambos, ocasionalmente, num restaurante. Persegue então Alice pelas
ruas mal iluminadas, nas quais se pressente uma transformação. Alguns animais
são mortos pelo caminho, e as pegadas de uma pantera que se afasta vão dando
lentamente lugar às marcas de uns sapatos de mulher, de saltos altos. Nessa
noite, os pesadelos invadem o sono de Irene que vê o mal a espalhar-se pelo
mundo, sob a aparência de uma pantera, associando a figura do psicanalista a
João da Sérvia que, de espada em punho, procura afastar o vício.
Chega-se
à cena mais célebre de “Cat People”. Alice
vai tomar banho a uma piscina pública. Irene persegue-a. Um pequeno gato preto
circula por ali, de forma a introduzir uma zona de ambiguidade em tudo o que
depois irá acontecer. Quando Alice apaga a luz da piscina, depois de tomar
banho, e se prepara para a abandonar, ouve o rugir de uma pantera e vê,
reflectida, a sombra de um felino. Refugia-se no centro da piscina, grita por
socorro, mas, quando as empregadas chegam, vêem Irene que explica que a amiga
se assustara quando ela apareceu na escuridão. Tudo parece estar resolvido,
excepto o roupão de banho de Alice, que se encontra completamente
esfrangalhado, transformado o tecido em tiras, pelas unhas cortantes, ou a
faca, ou as garras, de algo ou alguém que, entretanto, por ali passara. Quem? O
quê?
Irene
regressa então ao psicanalista que lhe diz que “essas alucinações são perigosas, que a fuga para a fantasia está à
beira de a levar à loucura: Só você
pode ajudar-se a si própria”. Mas, quando Irene se afasta, olha-a com o
desejo de quem sabe que aquela mulher encerra algo de fascinante que ele mesmo
irá tentar descobrir. Depois de algumas peripécias, depois de uma nova
perseguição de Irene a Alice no escritório de Reed, que este esconjura com a
sombra de um pedaço de madeira que se projecta como uma cruz, o Dr. Judd irá
encontrar Irene e beijá-Ia. A transformação em pantera pressente-se de novo
através da iluminação que se extingue, e assiste-se a uma luta entre ambos que
acabará com a morte do psicanalista e a fuga de Irene com o peito trespassado
por parte da espada que nele se partira. Dirige-se até ao jardim zoológico,
onde liberta finalmente a pantera enjaulada, que, ao saltar para a rua, é
atropelada por um carro, enquanto lá dentro sucumbe também Irene, prostrada
pela ferida que transportava consigo, Reed e Alice apenas confirmam a sua morte
e os seus temores: “Ela nunca nos
mentiu”. Afastam-se, pois, por entre o nevoeiro, enquanto nova citação
encerra o filme: “Mas o pecado mais
negro traiu a noite sem fim. Ambos, partes do meu mundo, pecado e noite, têm de
morrer.”
Todo
o cinema de Tourneur se encontra encerrado nesta obra. A dualidade de
personagens que coexistem em Irene (a tranquilidade doce da sua aparência, a
violência brutal do seu íntimo), a oposição entre a luz e as trevas
(identificando-se aqui noite com pecado: é na escuridão que Irene se
transforma, real ou metaforicamente, nessa pantera de instintos indomináveis
que aterroriza a outra Irene), o estilo narrativo onde predomina a elipse, onde
se subentende sempre mais do que se mostra claramente, o tipo de iluminação que
cria zonas de sombras ameaçadoras, e projecta sobre os personagens, redes e
teias que os aprisionam (em quase todo o filme as grades das janelas
projectam-se sobre os personagens como prisões invioláveis), o próprio estilo
de representação, quase segredado, ciciado, onde se confessam temores íntimos e
ameaças inlocalizáveis, a neutralidade da interpretação, que se aproximam
daquela estética da inexpressividade de que falou Jacques Lourcelles, quando se
referia a este “Keaton do trágico”. Neste
aspecto, o trabalho de Simone Simon é notável de sobriedade e de contenção,
transformando a sua figura numa inesgotável fonte de mistério e de secretas
ambiguidades. “Se a introdução do
inexplicável no seio da normalidade quotidiana é a essência mesma do
fantástico, realizaram-se muito poucos filmes tão radical e permanentemente
fantásticos como “Cat People” e “I Walked With a Zombie”, afirma Miguel
Marias no seu estudo dedicado ao cinema fantástico de Tourneur. E realmente
raras vezes essa perturbante sensação de normalidade ameaçada pelo inexplicável
nos foi transmitida em cinema com uma tal economia de meios, com um tal pudor,
com uma tamanha elegância de estilo. Tudo é possível e impossível em “Cat People”. Uma interpretação
psicanalista, através da análise de uma personagem frígida que tem medo da sua
libido liberta, é a solução que se apresenta com maior plausibilidade. Mas,
nesse caso, como explicar as transformações das pegadas em passos de mulher, e
a própria morte do Dr. Judd? Mas, dentro do próprio filme, podem-se encontrar
justificações para muitos acontecimentos julgados estranhos, que o engenho dos
argumentistas e do realizador ajudam a tomar solúveis num plano racional pela
dispersão de pequenos dados (o gato na cena da piscina, por exemplo). Voltando
a citar Miguel Marias: “Cat People”
actua de forma insidiosa, posto que, tal como “Os Pássaros”, de Hitchcock,
aceita, e até sugere, hipóteses “lógicas e racionais”, para logo as desmentir
ou pelo menos, pô-las em dúvida, mantendo até final e mesmo “depois” um máximo
de ambiguidade”. Este estudo particularmente interessante sobre a obra de
Tourneur, e nomeadamente sobre “Cat People”, acentua um aspecto
essencial desta película e de toda a obra de Tourneur: “Tourneur parece empenhado em parte por afã experimental e como
consequência de uma reflexão sobre a natureza e a função do cinema fantástico,
mas também por causa das limitações económicas da série B, em minar a nossa
complacente sensação inicial de segurança: as nossas tentativas de recuperá-la
resultam vãs, frente à sua firme negação de qualquer explicação lógica,
natural, psicológica, onírica ou até simbólica”. E mais adiante: “Resulta, pois, que no final do filme o
inexplicável permanece inexplicável. O mistério não foi submetido, desdobrado,
dissipado, resolvido ou esclarecido; pelo contrário, as forças do insólito
triunfam e a película – o seu enigma, as suas inquietantes implicações - não
acaba com a palavra “fim” (...). “E não é um final “aberto”, mas
irremediavelmente fechado, irrefutavelmente enclausurado à nossa forma de
raciocinar. A sua capacidade é total, o seu mistério é o mesmo - incitante,
tantalizador, instigador da curiosidade - que o de uma porta ou uma janela
fechada.
Diante de “Cat People” não nos fica outra
alternativa que não seja renunciar a desvanecer o seu mistério - e conviver com
essa sensação de impotência - ou alterar radicalmente a nossa concepção do real
e do imaginário, do possível e do impossível, do natural e do sobrenatural.” Rodado em 21
dias, com um orçamento de 130 000 dólares, “Cat People” renderia mais de um milhão, só durante a estreia.
A PANTERA
Título original: Cat People
Realização: Jacques
Tourneur (EUA, 1942); Argumento: De Witt Bodeen (com colaboração de Val
Lewton); Música: Roy Webb; Director musical: C. Bakaleinikoff; Orquestradores:
Leonid Raab, John Leipold; Fotografia (p/b): Nicholas Musuraca; Montagem: Mark
Robson; Direcção artística: Albert S. D'Agostino, Walter E. Keller; Decoração:
A. Roland Fields, Darrell Silvera; Guarda-Roupa: Renié; Assistentes de
realização: Doran Cox, Robert Aldrich; Som: John L. Cass; Efeitos Especiais:
Vernon L. Walker; Efeitos Visuais: Linwood G. Dunn; Supervisor: Lou L. Ostrow;
Treinador de animais: Mel Koontz; Produção: Val Lewton. RKO.Intérpretes: Simone Simon (Irena
Dubrovna Reed), Kent Smith (Oliver 'Ollie' Reed), Tom Conway (Dr. Louis Judd),
Jane Randolph (Alice Moore), Jack Holt (o comodoro), Henrietta Burnside (Sue
Ellen), Alec Craig (tratador de animais), Eddie Dew (polícia de rua), Elizabeth
Dunn (Miss Plunkett), Dynamite (leopardo), Dot Farley (Mrs. Agnew, a porteira),
Mary Halsey (Blondie), Theresa Harris (Minnie), Charles Jordan (conductor de
autocarro), Donald Kerr (taxista), Connie Leon (vizinho), Murdock MacQuarrie
(porteiro), Alan Napier (Doc Carver), Betty Roadman (Mrs. Hansen), Elizabeth
Russell (a mulher pantera), Steve Soldi (organista), etc. Duração: 73 minutos; Estreia mundial: Los Angeles, 12 de Novembro
de 1942; Estreia em Portugal: Lisboa, Éden, 3 de Setembro de 1943; Distribuição
em Portugal: Costa do Castelo (DVD); Classificação etária: M/ 12 anos.
JACQUES TOURNEUR
(1904-1977)
Jacques
Tourneur nasceu em Paris a 12 de Novembro de 1904 e vem a falecer em Bergerac,
Dordogne, Aquitânia, França, a 19 de Dezembro de 1977. Filho de uma actriz
célebre, Van Doren (cujo nome verdadeiro era Fernande Petit) e de um excelente
cineasta, Maurice Tourneur (Maurice Thomas, na realidade), estuda primeiramente
no liceu Montaigne, depois no Lakanai, até que, em 1914, parte com a mãe para
Hollywood, juntando-se a seu pai que já lá trabalhava desde Maio desse ano. Mas
fica em Nova Iorque a estudar, frequentando a New York Public School. Só em
fins de 1918 voltaria à Califórnia para junto dos pais, matriculando-se então
na Private School of Santa Barbara, depois na Hollywoold High School, onde
esteve até Junho de 1924. Tornara-se cidadão americano em 1919, e em 1922,
aproveitando umas férias, fizera figuração em “Scaramouche”, de Rex Ingram.
Quando
acabou os estudos, iniciou logo uma carreira ligada ao cinema, primeiramente
como “script-clerk” nos últimos seis filmes rodados pelo pai nos EUA, depois
como “stock-actor” nos estúdios da Metro Goldwing Mayer. Em fins de 1929
regressa à Europa, primeiro à Alemanha, depois a França, acompanhando o pai,
sendo seu assistente, e mais tarde começando a colaborar também na montagem.
Passa à realização e dirige algumas comédias. Em 1935, já casado, decide
arriscar na América, onde recomeça como realizador de segunda equipa e depois
passou a dirigir curtas-metragens para o departamento especial da M. G M.
Depois de três anos de aprendizagem na escola do documentarismo, foi um pouco
por acaso que Jacques Tourneur rodou a sua primeira longa-metragem, “They AlI
Come Out”, em 1939, a
que se segue aquele que poderá ser considerado o seu primeiro filme de fundo,
idealizado inicialmente como tal. Trata-se de “Nick Carter, Master Detective”,
com Walter Pidgeon. Em 1942 será a vez de ingressar na RKO, para onde vai ser
conduzido pela mão amiga de Val Lewton, iniciando uma série de obras de cariz
fantástico que o lançarão definitivamente como realizador e autor de um estilo
muito pessoal. “Cat People” (A Pantera), “I Walked with a Zombie” (Zombie),
“The Leopard Man” (O Homem Leopardo), “Days of Glory”, “Experiment Perilous”
(Noite na Alma), “Out of the Past” (O Arrependido), “Berlin Express” (O
Expresso de Berlin), “Stars in My Crown”, “The Flame and the Arrow” (O Facho e
a Flecha), “Night of the Demon” “ (Noite do Demónio) ou “Nightfall” (Ao Cair da
Noite), entre outros, demonstram bem o seu talento.
Filmografia
Como
realizador
1931: Tout ça ne Vaut pas l'Amour ou Un Vieux Garçon
(França)
1933:
Toto (Totó) (França)
1933:
Pour être Aimé (Para ser Amado) (França)
1934: Les Filles de la Concierge (França)
1936: The Jonker Diamond (curta-metragem. Entre a ficção
e o documentário)
1936: Harnessed Rhythm ou A Sports Parade Subject: Harnessed Rhythm (curta-metragem.
Documentário)
1936: Master Will Shakespeare (curta-metragem)
1936: Killer-Dog (curta-metragem)
1937: The Rainbow
Pass (curta-metragem)
1937: The Man in the Barn (curta-metragem)
1937: The Grand Bounce (curta-metragem)
1937: The Boss Didn't Say Good Morning
(curta-metragem)
1937: Romance of Radium (curta-metragem)
1937: The King Without a Crown (curta-metragem)
1937: What Do You Think? (curta-metragem)
1937: Strange Glory (curta-metragem)
1938: The Ship That Died (curta-metragem)
1938: What Do You Think? (Number Three) (curta-metragem)
1938: The Face Behind the Mask (curta-metragem)
1938: What Do You Think?: Tupapaoo ou What Do You
Think No. 4: Tupapaoo (curta-metragem)
1938: Think It Over (curta-metragem)
1939: Yankee Doodle Goes to Town (curta-metragem)
1939: They All Come Out (curta-metragem)
1939: Nick Carter, Master Detective (NICK CARTER, REI
DOS DETECTIVES)
1940: Phantom Raiders ou Nick Carter in Panama
(NICK CARTER NO PANAMÁ)
1941: Doctors Don't Tell
1942: The Incredible Stranger
1942: The Magic Alphabet (curta-metragem)
1942: Cat People (A Pantera)
1943: I Walked with a Zombie (Zombie)
1943: The Leopard Man (O Homem Leopardo)
1944: Days of Glory
1944:
Experiment Perilous (Noite na Alma)
1944:
Reward Unlimited (documentário de Guerra)
1946: Canyon Passage (Amor Selvagem)
1947: Out of the Past ou Build My Gallows High (O
Arrependido)
1948:
Berlin Express (O Expresso de Berlin)
1949:
Easy Living ou Interference (Morrendo para Viver)
1950: Stars in My Crown
1950: The Flame and the Arrow ou The Hawk and the Arrow (O Facho e a Flecha)
1951: Circle of Danger (Círculo De Ferro)
1951: Anne of the Indies
(A
Rainha Dos Piratas)
1952: Way of Gaúcho (O
Gaúcho)
1953: Appointment in Honduras
ou Jungle Fury (Encontro Nas Honduras )
1955: Stranger on Horseback
1955: Wichita (Wichita )
1955-1958: Jane Wyman Presents The Fireside Theatre ou
Jane Wyman Presents ou Jane Wyman Theater
(Série de TV) (EUA, 1955-1958) Jacques Tourneur (ep. "Kristi"
e “The Mirror”)
1955-1962: General Electric Theater ou G.E. Theatre
(EUA, 1953-1962) (série de TV) Into the Night - Ep. 3.30; Aftermath ou Mr.
Preach ou The Code of Jonathan West – Ep. 8.28; Star Witness: The Lili Parrish
Story – Ep. 10.8. Algumas
fontes referem ainda como realizado por Tourneur o episódio The Martyr Ep.
3.17.
1956: Great Day in the Morning (Terra Sangrenta)
1957: Night of the Demon ou Curse of the Demon ou
Haunted (Noite do Demónio)
1957:
Nightfall (Ao Cair da Noite)
1951-1959: Schlitz Playhouse of Stars ou Herald
Playhouse ou Schlitz Playhouse ou The Playhouse (Série de TV – 1951-1957) Jacques
Tourneur (ep.“Outlaw’s Boots”)
1957-1958: The Walter Winchell File - (série de TV-
1957-1958)
The Steep Hill – Ep. 1.13; The Stop-over – Ep. 1.25; House
on Biscayne Bay
1958: Cool and Lam (1958) (TV)
1958-1959: Northwest Passage (série de TV, 1958-1959) Jacques
Tourneur (ep. "The Assassin", "The Bound Women",
“The Burning Village”, "Break Out", "The Gunsmith",
"The Traitor", "The Vulture", “The Hostage” e “The Burnning
Village” (?)
1959:
Mission of Danger (Bandeirantes da Fronteira)
1959: Timbuktu (Timbuktu )
1959:
Frontier Rangers (Bandeirantes em Perigo)
1q959:
La Battaglia di Maratona ou La Bataille de Marathon ou Giant of Marathon (O
Gigante de Maratona)
1959-1973:
Bonanza ou Ponderosa (Bonanza) (Série de TV- 1959-1973) Jacques Tourneur (ep. "Denver McKee")
1959-1962: Adventures in Paradise (Série de TV -
1959-1962) Jacques Tourneur (ep. "A Bride for the Captain")
1959-1964: The Twilight Zone (Quinta Dimensão) (série de
TV - 1959-1964) Jacques Tourneur (ep. "Night Call")
1959-1960:
The Alaskans (Série de TV - 1959-1960)
1960: The Barbara Stanwyck Show (série de TV) Jacques
Tourneur (ep. “The MinkCoat”)
1961: Fury
River
1961-1962: Follow the Sun (série de TV -1961-1962) Sergeant Kolchak Fades Away – Ep. 1.20
(28 Janeiro 1962)
1964: The Comedy of Terrors ou The Graveside Story (O
Gato Miou Três Vezes)
1965: The City Under the Sea ou City in the Sea ou
War-Gods of the Deep (A Cidade Submarina)
1966: "T.H.E. Cat" (série de TV, 1966-1967) Jacques
Tourneur (ep. “The Ring of Anasis”)
SIMONE SIMON
(1910-2005)
Simone
Thérèse Fernande Simone nasceu a 23 de Abril de 1910, em Béthune,
Pas-de-Calais, segundo umas fontes, em Marselha, Bouches-du-Rhône, França,
segundo outras referências, e faleceu em Paris, França, a 22 de Fevereiro de
2005. Passou grande parte da sua juventude em Madagascar, onde o pai
administrava uma mina de grafite. Depois andou de um lado para o outro, entre
Berlim, Budapeste e Turim, antes de estabelecer em Paris, em 1930. Começou a
trabalhar como designer de moda, e estreou-se no teatro musical e depois no
cinema, sob a égide de Marc Allégret. O seu primeiro filme importante foi “A
Fera Humana” (1938), uma realização de Jean Renoir. Em 1936, Darryl F. Zanuck
convida-a a ir para Hollywood, para ingressar na 20th Century Fox. Dificuldades
com o seu inglês atrasaram a sua estreia que só se veio a efectivar em 1941,
num filme de William Dieterle “O Homem Que Vendeu a Alma”. No ano seguinte
assegurava a imortalidade como protagonista de “The Cat People”, um clássico de
filme fantástico, assinado por Jacques Tourneur. Manteve-se na RKO noutras
produções idênticas, mas sem o sucesso do seu trabalha em “A Pantera”. O FBI
teve-a sob vigilância, aquando da sua relação com o famoso espião duplo Dusko
Popov, que era considerado espião alemão, mas finalmente estava a soldo dos
ingleses. (Popov acabaria por servir de inspiração a Ian Fleming, para a
criação do seu famoso James Bond). Simone Simon nunca casou, mas foram-lhe
conhecidas muitas aventuras amorosas, inclusive com George Gershwin, que deve
ter escrito em sua honra "Love Walked In". De novo em França apareceu
nalgumas obras de Max Ophuls. Morreu em Paris, com 94 anos, de causas naturais.
Filmografia:
1931:
On opère sans douleur, de Jean Tarride
1931: Durand contre Durand, de Eugen Thiele e Léo Joannon
1931: Mam'zelle Nitouche, de Marc Allégret
1931: Le chanteur inconnu, de Viktor Tourjansky
1932: Pour vivre heureux, de Claudio de la Torre
1932: La petite chocolatière, de Marc Allégret
1932: Un fils d'Amérique (Um Filho da América), de
Carmine Gallone
1932: Le roi des palaces (O Rei dos Palaces), de Carmine
Gallone
1933: Tire au flanc, de Henry Wulschleger
1933: Prenez garde à la peinture, de Henri Chomette
1933: L'étoile de Valencia (A Estrela de Valência), de
Serge de Poligny
1933: Le voleur (O Ladrão), de Maurice Tourneur
1934: Ladies Lake (O Lago do Amor), de Marc Allégret
1935: Les yeux noirs (Olhos Negros), de Viktor Tourjansky
1935: Les beaux jours, de Marc Allégret
1936:
Girls' Dormitory (Dormitório de Raparigas), de Irving Cummings
1936: Ladies in Love, de Edward H. Griffith
1937: Seventh Heaven (A Hora Suprema), de Henry King
1937: Love and Hisses, de Sidney Lanfield
1938: Josette (A Falsa Josette), de de Allan Dwan
1938: La Bête Humaine (A Fera Humana), de Jean Renoir
1940:
Cavalcade d'amour (Cavalgada do Amor), de Raymond Bernard
1941: The Devil and Daniel Webster ou All That Money
Can Buy (O Homem Que Vendeu a Alma), de William Dieterle
1942: Cat People (A Pantera), de Jacques Tourneur
1943:
Tahiti Honey (Noivo Imaginário), de John H. Auer
1944: Mademoiselle Fifi (Mademoiselle Fifi), de Robert
Wise
1944: The Curse of the Cat People (A Maldição da
Pantera), de Gunther von Fritsch e Robert Wise
1944: Johnny Doesn't Live Here Any More, de Joe May
1946: Pétrus (Petrus), de Marc Allégret
1947: Temptation
Harbour (O Porto da
Tentação), de Lance Comfort
1950: Women Without Names (Mulheres Sem Nome), de Géza
von Radványi
1950: La Ronde (A Ronda), de Max Ophüls
1951: Olivia (Olivia), de Jacqueline Audry
1952: Le Plaisir (O Prazer) (episódio "Le
Modèle"), de Max Ophüls
1954:
Siegfried ou A Double Life ou Das zweite Leben, de Victor Vicas
1954: I tre
ladri (Os Três Ladrões), de Lionello De Felice
1956: The Extra Day, de William Fairchild
1957: La femme en bleu (A Mulher de Azul), de Michel
Deville
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